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"Semana São Lourenço" - Anos de frutífera caminhada

03/08/2020

* Diác. José Bezerra de Araújo

             Este artigo conta parte da minha história como o primeiro Diácono Permanente do Rio Grande do Norte. Foram anos de caminhada. A instauração do Diaconato Permanente na Província Eclesiástica de Natal, composta pela Arquidiocese de Natal e as Dioceses de Caicó e Mossoró, começou por Caicó, a menor das três, situada a 280 km de Natal. Dois personagens desempenharam papel fundante nessa instauração: o então bispo caicoense, Dom Heitor de Araújo Sales, que governou a Diocese de 1978 a 1993, e o então vigário geral, Mons. Ausônio Tércio de Araújo. A caminhada começou nos anos 80, quando Dom Heitor, depois de uma conversa com o Mons. Ausônio Tércio, autorizou a formação de homens visando a formação para esse ministério ordenado.

            Não sei se foi coincidência ou atitude proposital do Mons. Ausônio Tércio, nosso primeiro formador, mas os escolhidos para esse grupo eram 7 homens, como ocorrera na época dos Apóstolos: “(...) escolhei dentre vós sete homens de boa reputação, cheios do Espírito Santo e de sabedoria…” (cf. At 6,3). Éramos Agostinho Francisco dos Santos, Geraldo Soares Wanderley, José Bezerra de Araújo, José Ribamar de Medeiros, Laerte Medeiros, Nelson Moysés de Araújo e Ronaldo Carlos Dantas de Souza.

            Quando começamos os estudos não havia uma grade curricular de disciplinas para a formação de Diáconos Permanentes na Diocese de Caicó e nem no Regional Nordeste 2, ao menos até onde sabíamos. Nossos estudos de Teologia, orientados pelo Mons. Ausônio Tércio, eram com base na coleção “A Fé da Igreja”, de Michael Schmaus. Semanalmente nos reuníamos com o Monsenhor para aprofundar a leitura e dirimir dúvidas. Com o passar dos anos, a formação prosseguia através de encontros e com a introdução de outras disciplinas e formadores.

            Na época, ainda havia uma espécie de “resistência silenciosa” de alguns Padres do clero de Caicó à introdução desse Ministério Ordenado. “Resistência silenciosa” porque eles tinham o Sr. Bispo Dom Heitor em alta e sincera estima e não se disponham a confrontá-lo na decisão tomada. Ao que parecia, o Concílio Vaticano II e a Lumen Gentium haviam chegado à Igreja diocesana, mas ainda não se tinham alojado na mente e no coração de alguns dos presbíteros.

            Acredito que o Dom Heitor tinha consciência dessa “resistência silenciosa”. Tanto que, certa vez, convidou o Diácono José Durán y Durán, da Diocese de Palmares-PE, para participar de uma reunião do Clero da Diocese de Caicó e falar sobre o Ministério Ordenado do Diaconato Permanente. Muito tempo depois, numa conversa em que relembrava comigo o processo de instauração do Diaconato na Diocese de Caicó, Dom Heitor comentou que, naquele dia, quando anunciou a chegada do Diácono Durán na reunião, ouviu um “cochicho” de um dos presbíteros dizendo: “está vindo aí quem quer tomar nosso lugar”.

            Depois de uma longa caminhada de estudos, eu, José Bezerra de Araújo, fui escolhido para ser ordenado Diácono Permanente. Lembro-me que questionei - “por que só eu e não os outros ou alguns dos outros?” Dom Heitor e Mons. Tércio me explicaram que se tratava de uma decisão estratégica. A escolha de meu nome foi baseada no fato de eu ser Secretário de Gabinete de Dom Heitor, na Diocese, o que daria credibilidade junto ao clero e ao povo de Deus. Entendi, então, que do meu agir e do meu proceder como pai de família e como diácono dependia o futuro da caminhada diaconal na Diocese de Caicó.

            E, pela imposição das mãos de Dom Heitor, fui ordenado no dia 19 de março de 1987. Três anos depois, no dia 21 de outubro de 1990, foi ordenado o segundo do grupo, José Ribamar de Medeiros, e em 10 de agosto de 2008, o terceiro do mesmo grupo, Nelson Moysés de Araújo. Os outros 4, por razões diversas, não prosseguiram na caminhada rumo ao Ministério Diaconal.

            Apesar de todo zelo e cuidado no meu ser e agir como pai de família e como diácono, houve resistências por parte de alguns leigos no exercício do Ministério diaconal. Um cidadão, certa vez, procurou um dos padres para questionar “se tinha sido válido o batismo de um filho seu, porque não tinha sido batizado não por um padre, mas pelo Diácono”. E disse ao Padre que queria que ele batizasse o filho… Mas aceitou a explicação do Padre sobre a validade do batismo realizado pelo Diácono.

            Dom Heitor também foi o responsável pela instauração do Diaconado Permanente na Arquidiocese de Natal, durante seu pastoreio, no período de 1993 a 2003. Os dois primeiros ordenados por ele na Arquidiocese foram Francisco Adilson da Silva e Francisco das Chagas Teixeira de Araújo, ordenados no dia 29 de novembro de 1997. Recordo um fato interessante. Dom Heitor me pediu para participar da ordenação, mas eu aleguei que estava com um compromisso exatamente na data e me desculpei. Mas ele insistiu com um argumento irrefutável. Ele queria que eu, o único Diácono Permanente no Rio Grande do Norte, fosse o proclamador do Evangelho na missa de ordenação. Entendi que ele queria dar visibilidade do Ministério Diaconal perante o povo e o Clero da Arquidiocese de Natal. Então, desmarquei o compromisso e participei dessa celebração.

            A “semente” do Diaconato Permanente “semeada” na seara da Igreja Povo de Deus, no Rio Grande do Norte por Dom Heitor de Araújo Sales e Mons. Ausônio Tércio de Araújo, começando pela Diocese de Caicó, “germinou”, “cresceu” e ainda hoje continua gerando “frutos” na Igreja de Jesus Cristo.

Atualmente, são 45 Diáconos Permanentes incardinados e residentes na Diocese de Caicó, e dois incardinados e não residentes. Na Arquidiocese de Natal, são 100 incardinados e residentes, e 2 residentes (incardinados na Diocese de Caicó). A Diocese de Mossoró tem 6 diáconos incardinados e residentes. São os primeiros da Diocese, ordenados pelo atual bispo, Dom Mariano Manzana.

Essa caminhada longa, iniciada na Diocese de Caicó, na década dos anos 80, com a minha ordenação, assemelha-se a uma árvore que, quanto mais “idosa”, produz mais e melhores frutos. Que seja “irrigada” com o nosso ser e agir diaconal. Deus seja louvado!

* O diácono José Bezerra de Araújo, da Arquidiocese de Natal (RN), é jornalista, assessor de imprensa da Arquidiocese e integrante da Equipe Nacional de Assessoria de Comunicação – ENAC da Comissão Nacional dos Diáconos - CND